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19 de Abril de 2024

Autorização Judicial na Realização de Prisões sem penas e buscas domiciliares

Publicado por Alm Li Diane
há 8 anos

Prisões cautelares são todas aquelas que ocorrem anteriormente ao trânsito em julgado da sentença penal condenatória, somente podendo ser decretadas, em virtude do princípio da presunção de não culpabilidade, nos casos estritamente necessários. Assim menciona o art. 283 do Código de Processo Penal, com a nova redação que lhe foi conferida pela lei nº 12.403/2011, in verbis:

“Ninguém poderá ser preso senão em flagrante delito ou por ordem escrita e fundamentada da autoridade judiciária competente, em decorrência de sentença condenatória transitada em julgado ou, no curso da investigação ou do processo, em virtude de prisão temporária ou prisão preventiva”.

Dessa forma, de acordo com a redação dada pela nova lei processual acima mencionada, podemos apontar existir três modalidades de prisão cautelar, a saber:

A) prisão decorrente de situação de flagrante delito. Esta modalidade de prisão seja pré-cautelar;

B) prisão temporária;

c) prisão preventiva.

As prisões decorrentes da decisão de pronúncia e de sentença penal condenatória recorrível não são mais obrigatórias após o advento desta lei e somente subsistirão se respeitado seu caráter cautelar.

Vamos falar um pouco da prisão em flagrante, que para alguns é pré-cautelar.

Estou a chamando de prisão cautelar, pois estamos diante de um caso em que a liberdade de alguém está sendo cerceada antes do trânsito em julgado da sentença penal condenatória.

A prisão sem pena é a segregação da liberdade de alguém antes do trânsito em julgado de sentença condenatória, isto é, cautelarmente, independentemente do seu tempo de duração. Já a prisão pena é a decorrente do trânsito em julgado de sentença penal condenatória, isto é, trata-se do cumprimento/execução da pena privativa de liberdade. Por isso acabo por chamar a prisão em flagrante de prisão cautelar, pois não deixa de ser uma espécie de prisão sem pena, prisão que ocorre antes do trânsito em julgado de sentença condenatória, sem, contudo, dizer estar a outra posição incorreta.

Ademais, segundo esta nova lei, o direito à liberdade é a regra, sendo exceção a sua privação. Por isso, nos países democráticos, onde se valoriza a dignidade da pessoa humana, as possibilidades de privação da liberdade estão exaustivamente disciplinadas, assim como ocorre no Brasil, segundo o art. 283 do Código de Processo Penal, que menciona:

“Ninguém poderá ser preso senão em flagrante delito ou por ordem escrita e fundamentada da autoridade judiciária competente, em decorrência de sentença condenatória transitada em julgado ou, no curso da investigação ou do processo, em virtude de prisão temporária ou prisão preventiva”.

Assim, podemos perceber que todas as hipóteses de prisão no Brasil estão expressamente previstas na legislação e como regra dependem de autorização judicial para que sejam decretadas, com exceção da prisão em flagrante. Esta última poderá/deverá ser realizada independentemente de autorização judicial quando presentes os requisitos legais para sua realização.

Importante frisar, que a prisão em flagrante, mesmo com o advento da nova lei processual penal alhures mencionada, continua sendo de realização obrigatória para os agentes policiais, como se vê do disposto no art. 301 do Código de Processo Penal ao mencionar que “qualquer do povo poderá e as autoridades policiais e seus agentes deverão prender quem quer que seja encontrado em flagrante delito”.

Portanto, existe um dever imposto pelo Estado aos agentes de segurança pública para realizarem a prisão de quem esteja em flagrante delito. Assim agindo, os policiais terão o feito no estrito cumprimento do dever legal, isto é, amparados por norma mandamental, não poderão ser responsabilizados por qualquer infração penal, desde que tenham agido dentro dos limites legais.

Como dito, o policial que realizar a prisão em flagrante de alguém não terá agido ilicitamente, pelo contrário, estará amparado por norma excludente da ilicitude (norma mandamental). Porém, agirá ilicitamente caso deixe de realizar esta prisão a que está obrigado, isto é, responderá criminalmente caso deixe de prender quem está em flagrante delito. Neste caso poderá responder não somente pelo crime de prevaricação (art. 319 do CP), mas sim e também pelo crime que deixar de evitar, caso tenha esta possibilidade, conforme o previsto pelo art. 13, parágrafo 2º, inciso I, do Código Penal, vez que o policial tendo o dever de evitar o resultado (garantidor), caso não o faça, responderá pelo resultado que deixar de evitar. Trata-se neste caso do conhecido crime comissivo por omissão (omissão imprópria).

Portanto, é uma obrigação do agente policial realizar a prisão de quem está praticando um crime, tenha ou não havido algum resultado.

A prisão em flagrante está prevista nos artigos 301 a 310 do Capítulo II do Título IX do Código de Processo Penal, que merecem ser lidos.

A palavra flagrante é originária do latim “flagrantis” e diz respeito ao verbo “flagare”. Significa arder, queimar, estar em chamas. Ou seja, quando alguém for surpreendido em flagrante delito, significa ter sido encontrado cometendo uma infração penal, isto é, o delito estava ardendo quando o indivíduo foi flagrado cometendo-o. Este é o caso mais comum, porém o Código de Processo Penal, em seu art. 302 considera outras hipóteses em que se poderá entender pela situação de flagrante delito, que recebem as denominações de:

a) flagrante próprio (art. 302, I e II);

B) flagrante impróprio (art. 302, III);

c) flagrante presumido (art. 302, IV).

Podemos visualizar que as hipóteses de flagrante estão previstas taxativamente no Código de Processo Penal e sabemos, também, que quando o agente policial se deparar com uma dessas hipóteses deverá realizar a prisão, em razão da existência de dever legal.

Mencionemos também, de forma mais que especial, o flagrante realizado nos chamados crimes permanentes, naqueles cuja consumação se protrai (prolonga) no tempo, a exemplo do que ocorre com a prática dos crimes previstos na lei de drogas (lei nº 11.343/06) e no estatuto do desarmamento (lei nº 10.826/03).

Nestes crimes, enquanto durar a permanência o flagrante subsistirá e a prisão poderá/deverá ser realizada, sendo considerado espécie de flagrante próprio e previsto está no art. 303 do Código de Processo Penal:

“Nas infrações permanentes, entende-se o agente em flagrante delito enquanto não cessar a permanência”.

Esta espécie de prisão (prisão em flagrante) é a única modalidade que independe da autorização judicial para que seja realizada. Assim menciona o art. , inciso LXI, da Constituição Federal: “ninguém será preso senão em flagrante delito ou por ordem escrita e fundamentada de autoridade judiciária competente (...)”.

Ou seja, em todas as demais espécies de prisão exige-se autorização judicial para que sejam decretadas, devendo-se respeitar a cláusula de reserva jurisdicional. Isto é, a prisão preventiva e a temporária, espécies de prisão provisória, dependem de autorização judicial para que sejam efetivadas.

Agora surge uma questão interessante: deparando-se o agente policial com a prática de um crime no interior de uma residência, necessita ele de autorização judicial para que realize a prisão em flagrante do morador?

Sabemos que a prisão em flagrante independe de autorização judicial, mas sabemos que, como regra, a busca domiciliar depende de autorização judicial. Como solucionar esta questão?

A busca domiciliar está prevista no parágrafo 1º, do art. 240 do Código de Processo Penal. Para sua decretação e realização exige-se fundadas razões, isto é, que ao menos exista prévio conhecimento de que no interior da residência há o que se procura, como por exemplo, um criminoso, a vítima de um crime, um objeto criminoso, provas de um crime etc.

Isto significa dizer que a busca domiciliar não poderá ser arbitrária, ou seja, não poderá ocorrer desnecessariamente e, por isso, depende, como regra, de autorização judicial.

Como dito, como regra, a busca domiciliar depende de autorização judicial para que seja realizada. Assim bem menciona o art. 5, inciso XI, da Constituição Federal: ​

“A casa é asilo inviolável do indivíduo, ninguém nela podendo penetrar sem consentimento do morador, salvo em caso de flagrante delito ou desastre, ou para prestar socorro, ou, durante o dia, por determinação judicial”.Para que se possa realizar a busca domiciliar, exige-se, como regra, a necessária expedição de “competente ordem judicial, pois a Constituição Federal, em seu art. , XI, estabeleceu como direito e garantia individual a inviolabilidade do domicílio, só permitindo o ingresso na residência alheia em cinco hipóteses, taxativamente previstas, a saber:

a) com o consentimento do morador (a qualquer hora do dia ou da noite);

b) em caso de flagrante delito (independentemente de autorização judicial e a qualquer hora do dia ou da noite);

c) para prestar socorro (com ou sem o consentimento do morador e a qualquer hora do dia ou da noite);

d) durante o dia (fora das hipóteses acima), por determinação judicial”.

Perceba pela leitura do texto constitucional que a exigência de autorização judicial para ingressar em residência alheia para realizar busca em seu interior é a regra, ou seja, expressamente a lei maior do Estado democrático de direito exige autorização judicial para que a casa seja violada, tratando esta inviolabilidade do domicílio como direito fundamental do indivíduo. Porém, esta mesma lei autoriza que, excepcionalmente, preenchidos determinados requisitos, por óbvio, a casa possa ser violada independentemente de autorização judicial, como ocorre nos casos em que há flagrante delito, o qual passaremos a tratar.

Registra-se, assim, que o art. 241 do Código de Processo Penal restou tacitamente revogado, pois que, por determinação constitucional, mesmo estando a autoridade policial presente no momento da realização da diligência de busca domiciliar, como regra, exige-se, então, precedente ordem judicial para se realizar a busca domiciliar.

Mas como dito, esta é a regra, pois a própria constituição da república elenca os casos excepcionais em que a busca domiciliar poderá ser realizada independentemente de autorização judicial, como por exemplo, existindo situação de flagrante. Porém, para que tal diligência seja realizada sem autorização judicial, a lei processual penal exige haja fundadas razões para que os agentes policiais ingressem à residência.

Fundadas razões significa a existência de algum fato ou situação relevante que faz despertar no policial a necessidade de realizar a busca domiciliar, isto é, após possuir prévio conhecimento de que no interior daquela residência há a ocorrência de um flagrante delito, o policial se vê obrigado a nela ingressar para efetivar a prisão em flagrante, pois que obrigado está pela lei para assim agir, devendo realizar a prisão em flagrante de quem se encontrar nesta situação.

Evidente está, então, que fora dos casos de prisão em flagrante exige autorização judicial para que a prisão seja decretada e para que a busca domiciliar seja realizada, isto é, somente haverá a prisão de alguém, fora dos casos de flagrante delito, quando houver autorização judicial, como, por exemplo, nas prisões provisórias (prisão preventiva e temporária). E somente haverá o cumprimento do mandado destas prisões provisórias no interior de uma residência (busca e apreensão domiciliar) se houver autorização judicial, que somente poderá ser cumprido durante o dia, conforme preceitua a Constituição da República. Isto é, ainda que haja mandado de prisão, mas não haja mandado de busca domiciliar, este mandado não poderá ser cumprido no interior do domicílio, sendo este o ponto crucial.

Entretanto, e agora chegamos onde eu queria, havendo situação de flagrante delito, a prisão de alguém poderá/deverá ser realizada independentemente de autorização judicial e, da mesma forma, a busca e apreensão poderá ser realizada no interior do domicílio, daquele que está sendo detido, independente de autorização judicial, pois esta é uma autorização legal, como alhures já vimos. Porém, para que este ingresso - sem autorização judicial no interior do domicílio alheio - seja realizado, exige-se o requisito “fundadas razões” para tal.

O Supremo Tribunal Federal em recente julgado (RE 603616) mencionou que a fundada razão como requisito legitimador para o ingresso à residência alheia seria a “justa causa” para tal, ao afirmar que: “será exigida a justa causa, controlável a posteriori para a busca. No que se refere à segurança jurídica para os agentes da Segurança Pública, ao demonstrarem a justa causa para a medida, os policiais deixam de assumir o risco de cometer o crime de invasão de domicílio, mesmo que a diligência venha a fracassar”.

Este prévio conhecimento deve ser adquirido, segundo o STF, por meio de anteriores investigações e deve ser demonstrado por meios lícitos, como filmagens, relatórios ou testemunhas, não podendo, porém, ser estas testemunhas anônimas, pois que a Constituição Federal veda o anonimato (art. 5º, inciso IV) e este não poderá ser utilizado em prejuízo de alguém, ainda que por meio dele um crime seja encontrado.

Concordando com a decisão da Suprema Corte e afirmo que esta está inteiramente de acordo com o preceituado na nossa lei maior, a Constituição Federal, que é clara ao mencionar em seu texto que, em havendo flagrante delito, a casa é violável a qualquer hora do dia e independentemente de autorização judicial. Não há, então, como discordar deste posicionamento, posto que em consonância com o regramento constitucional.

Então podemos dizer, pelo que vimos, que ainda que haja mandado de prisão, mas não haja autorização judicial para se ingressar à residência do sujeito passivo deste mandado, este não poderá ser cumprido do interior da residência daquele, por ausência de previsão legal para tal. Entretanto, havendo fundadas razões de que no interior desta residência há um crime em flagrante, esta poderá ser violada a qualquer hora do dia e o morador poderá ser preso, mas o será em flagrante pelo crime que está praticando e não em razão do mandado de prisão expedido. Isto é, a prisão se dará pela existência de um crime em flagrante e não pelo cumprimento do mandado de prisão judicialmente expedido, pois a casa não poderá ser violada sem que haja expressa autorização judicial para cumprimento deste mandado em seu interior, mas poderá sim o ser para que a prisão em flagrante do morador seja realizada, por existir autorização legal e constitucional expressa nesse sentido, como vimos.

Neste sentido, lembremos que nos crimes permanentes o flagrante se prolonga no tempo, isto é, enquanto não cessar a permanência a prisão em flagrante poderá ser realizada (art. 303 do CPP) e nestes casos, por tudo que vimos, a busca domiciliar também poderá ser realizada e em qualquer dia e a qualquer hora, independentemente de autorização judicial, pois, se assim agir o policial, terá o feito no estrito cumprimento do dever legal e amparado está pela exceção prevista e autorizada pela constituição.

Em resumo, o mandado de prisão por si só não é capaz de autorizar a busca domiciliar, uma vez que o seu cumprimento no interior de domicílio alheio exige autorização judicial precedente que, inclusive, somente poderá ser cumprida durante o dia. Porém, ainda que haja mandado de prisão e não haja mandado de busca domiciliar, existindo um crime permanente (situação de flagrante) no interior de uma residência, agentes policiais poderão/deverão, caso haja fundadas razões para tal (justa causa), ingressar em seu interior, a qualquer hora do dia, e realizar a prisão em flagrante do morador, por existir expressa autorização constitucional para assim agirem (art. , XI, da CF) e expressa ordem legal para assim o fazer (art. 301 do CPP).

Concluindo, sendo a casa violável a qualquer hora do dia independentemente de autorização judicial em havendo situação de flagrante delito, e sendo a prisão em flagrante, daquele que está em flagrante, uma ordem legal imposta aos agentes policiais, havendo fundadas razões de que no interior de uma residência há um estado de flagrante, por exemplo um crime permanente, a busca domiciliar, independentemente de autorização judicial, e a prisão em flagrante do morador é uma obrigação legal.

Neste caso, assim agindo, o agente policial terá o feito no estrito cumprimento do dever legal e não há que se falar em crime de abuso de autoridade pela invasão de domicílio, pois que este, nestas circunstâncias, é violável.​

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