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19 de Abril de 2024

Reincidência e Prisão (Recidivism et in carcerem)

Publicado por Alm Li Diane
há 8 anos

A reincidência é um dos institutos mais antigos no âmbito jurídico. Podendo ser encontrado em todos os sistemas penais. “A agravação da situação do réu, no processo, em função da frequência da atividade criminosa, é ideia que aparece, mais ou menos patente, desde sempre e em todos os sistemas criminais, fundamentando-se na necessidade de reação contra o hábito de delinquir (consuetudo delinquendi), por isso mesmo revelador de especial tendência anti-social”.

No entanto, o conceito de reincidência sofreu mudanças com o passar dos séculos, assim como as suas consequências.

Ao formular o conceito de reincidência da alta Idade Média, pondera que decisivo era somente a habitualidade da delinqüência (...) Nos séculos posteriores, todavia, o conceito de reincidência, ligado à ideia de que humanum est peccare, diabolicum perseverare, começa a ser integrado pela exigência de uma condenação prévia, considerada como índice de desprezo do reincidente pela solene advertência da condenação ou da execução da pena, que, para além da inclinação criminosa do agente revelado pela reiteração dos factos criminosos, traduzia uma especial tendência “anti-social”.

Em relação ao Direito pátrio, em nosso primeiro Código Penal, verifica-se a existência desse instituto como agravante. Assim, tinha-se no Código de 1830, o artigo 16 com a redação: “Art. 16. São circunstancias agravantes:” e encontrava-se no § terceiro: “§ 3º Ter o delinquente reincidido em delicto da mesma natureza.”

Depois em 1890, o Código sucessor também trouxe a reincidência como agravante em seu artigo 39 § 19, e a seguir, no seu artigo 40, tinha a seguinte redação:

“Art. 40. A reincidencia verifica-se quando o criminoso, depois de passada em julgado sentença condemnatoria, commette outro crime da mesma natureza e como tal entende-se, para os efeitos da lei penal, o que consiste na violação do mesmo artigo”.

Por fim, o Código de 1940 na parte geral revogada, inovou trazendo a divisão da reincidência entre específica e genérica no artigo 46, § 1.

“Art. 46. Verifica-se a reincidência quando o agente comete novo crime, depois de transitar em julgado a sentença que, no país ou no estrangeiro, o tenha condenado por crime anterior.

Reincidência genérica e reincidência específica

§ 1º Diz-se a reincidência:

I - genérica, quando os crimes são de natureza diversa;

II - específica, quando os crimes são da mesma natureza

”.

Ainda na parte revogada, ficava clara a adoção do indesejável Direito Penal do Inimigo, ou Direito Penal do autor. Diz-se inimigo pois haveriam dois Direitos, o dos amigos e o dos inimigos, ou seja, não se importa com o fato em si, mas simplesmente com o autor, a pessoa que comete o delito – no caso, o inimigo. Assim, pelo simples fato da pessoa ser quem é, transforma-se em razão para o maior rigor.

“Ainda que não haja um critério unitário acerca do que seja o direito penal de autor, podemos dizer que, ao menos em sua manifestação extrema, é uma corrupção do direito penal, em que não se proíbe o ato em si, mas o ato como manifestação de uma “forma de ser” do autor, esta sim considerada verdadeiramente delitiva. O ato teria valor de sintoma de uma personalidade; o proibido e reprovável ou perigoso seria a personalidade e não o ato. Dentro desta concepção não se condena tanto o furto, como o “ser ladrão”.

Essa ideia ficava explícita no artigo 78, o qual trazia os presumidamente perigosos, entre eles, no inciso IV, os reincidentes em crime doloso.

Finalmente chega-se à lei em vigência, na qual não se encontra a definição da reincidência e sim a hipótese de constituição, ideia tirada da leitura do artigo 63:

“Art. 63. Verifica-se a reincidência quando o agente comete novo crime, depois de transitar em julgado a sentença que, no País ou no estrangeiro, o tenha condenado por crime anterior”.

No entanto, além da agravante genérica que pelo nosso ordenamento servirá de auxílio para a caracterização do infrator, a reincidência gera uma série de outras consequências relevantes que faz com que a sua caracterização seja da mais alta relevância.

E mais, Decreto Lei 3.688 de 1941 que trata das contravenções penais possui em seu artigo outra hipótese de reincidência:

“Art. 7. Verifica-se a reincidência quando o agente pratica uma contravenção depois de passar em julgado a sentença que o tenha condenado, no Brasil ou no estrangeiro, por qualquer crime, ou, no Brasil, por motivo de contravenção”.

Para maior entendimento segue o próximo tópico em que será feito a definição da ocorrência da reincidência e seus reflexos em nosso ordenamento.

No Direito Penal, tem-se a reincidência no momento em que o agente incorre em novo crime depois de ter contra si uma sentença transitada em julgado, no País ou no estrangeiro, condenando-o por crime anterior, respeitando o intervalo de cinco anos.

Todavia, conforme mencionado, a Lei de Contravencoes penais amplia o rol de ocorrência da reincidência para os casos de:

A) condenação de crime antes e outra de contravenção posteriormente;

b) condenação por contravenção antes e contravenção depois, necessariamente operada no território nacional. Com isso, não se encontra amparado no Código Penal ou na Lei de Contravenções a espécie de reincidência provinda de condenação por contravenção em uma conduta anterior e outra por crime posterior.

Para efeitos da reincidência, o legislador sustentou que o sujeito não poderia ficar sempre com o rótulo de possível reincidente, e por isso na reforma de 1984 foi dada a seguinte redação para o Código Penal:

“Art. 64 - Para efeito de reincidência:

I - não prevalece a condenação anterior, se entre a data do cumprimento ou extinção da pena e a infração posterior tiver decorrido período de tempo superior a 5 (cinco) anos, computado o período de prova da suspensão ou do livramento condicional, se não ocorrer revogação”.

Nesse sentido, a reincidência somente se torna aplicável se o intervalo entre a condenação com trânsito em julgado e o cometimento da nova infração penal estiver dentro do lapso de cinco anos. Caso contrário, o sujeito irá deixar de ser reincidente e tal fato passará a sustentar maus antecedentes, circunstância judicial do artigo 59 do Código Penal, utilizada para fixação da pena do condenado, ou ainda incorrer nas consequências mostradas no item 2.2.5 do presente trabalho.

Existe hoje o debate na jurisprudência e doutrina envolvendo o tempo que o sujeito poderia trazer consigo os maus antecedentes advindos de uma condenação anterior. Embora não seja o objetivo do presente trabalho, ressalta-se o comando constitucional do artigo 5º, inciso LVII, alínea b, o qual veda a pena perpétua.

Sendo assim, para evitar a marca ad aeternum dos maus antecedentes provenientes de uma pena, um dos caminhos seria uma analogia in bonan partem com o artigo 64, I do Código Penal, o que constituiria na impossibilidade de aplicação dos maus antecedentes após o limite de 5 anos do cumprimento ou extinção da pena.

“Os efeitos negativos dos antecedentes, ao contrário da reincidência, não estão limitados temporalmente em lei (art. 64 do CP) (...) Pensamos que, por similitude lógica, o decurso do período de cinco anos, considerado como dies aquo a data do cumprimento ou extinção da pena, que, segundo o artigo 64 do CP, faz desaparecer os efeitos da reincidência, deveria propiciar a recuperação da primariedade e dos bons antecedentes.

Carece de sentido que o tempo faça desaparecer a reincidência e não tenha a mesma força para fazer desaparecer os efeitos de causa legal de menor expressão jurídica, no caso, os antecedentes.”

Visto isso, deve-se atentar para o fato de que a reincidência não abrange os crimes militares ou políticos, disposição prevista no artigo 64, inciso II do Código Penal. E ainda, o fato de não importar qual a pena aplicada ao caso concreto, podendo ser qualquer uma, isto é, a de privativa de liberdade, restritiva de direitos ou multa. Devido a isso, até mesmo se o réu tenha obtido sursis da pena, ele será reincidente.

Questão interessante cerca o tema da causa extintiva da punibilidade, pois se afastará a reincidência se ela for declarada antes da sentença transitada em julgado – exceto caso tenha o fato deixado de constituir crime, abolitio criminis, ou ainda em hipótese de anistia, onde ela será afastada a posteriori.

Por sua vez, o perdão judicial nunca irá gerar reincidência, artigo 120 do Código Penal, matéria inclusive já simulada pelo Superior Tribunal de Justiça:

“STJ Súmula nº 18.

A sentença concessiva do perdão judicial é declaratória da extinção da punibilidade, não subsistindo qualquer efeito condenatório

”.

No âmbito do Juizado especial criminal, a lei foi clara ao dizer que a transação penal não produz reincidência ou maus antecedentes:

“Art. 76, § 4: ‘Acolhendo a proposta do Ministério Público aceita pelo autor da infração, o juiz aplicará a pena restritiva de direitos ou multa, que não importará em reincidência, sendo registrada apenas para impedir novamente o mesmo benefício no prazo de cinco anos”. Ao cabo, pode-se classificar a reincidência em real, quando o agente volta a delinquir depois de ter cumprido pena, ou na reincidência ficta, quando o mesmo comete nova infração após condenado, mas sem ter passado realmente pelo cumprimento de pena.

Lembrando aqui as duas categorias já citadas de reincidência: específica – aplicável quando o sujeito comete o mesmo crime - e genérica – em caso de crime posterior diverso.

Reflexos da reincidência na parte geral do Código Penal:

1.1. Agrava a pena.

No artigo 61, inciso I do Código Penal tem-se que a reincidência irá exasperar a pena privativa de liberdade em quantidade determinada pelo juiz, sem, no entanto, ultrapassar os limites da cominação prevista para determinado crime.

1.2. Prepondera no concurso de agravantes e atenuantes

Reza o artigo 67, parte final do Código Penal, que caso ocorram múltiplas incidências nas causas judiciais do artigo 59 do mesmo Código, para a fixação da pena, a agravante pela reincidência deve prevalecer em relação às atenuantes.

1.3. Afasta a possibilidade da substituição da pena privativa de liberdade para restritivas de direitos em crime doloso, salvo, reincidência não específica.

O ordenamento jurídico brasileiro possibilita que a pena privativa de liberdade seja substituída por outra restritiva de direitos (v. G. Prestação pecuniária), desde que preenchidos certos requisitos legais e por expressa letra da lei. No artigo 44, inciso II do Código Penal, caso seja reincidente em crime doloso o agente não poderá receber tal benefício.

No entanto, o § 3º do referido artigo reza que caso não seja reincidente específico e a substituição seja socialmente recomendada, é possível a concessão da pena restritiva de direitos.

E ainda, reza o § 5 do mesmo artigo que o juiz da execução, na unificação das penas, em caso de condenação posterior, a substituição poderá converter a mesma em privativa de liberdade. Ou seja, após a substituição, a reincidência é causa de conversão em pena privativa de liberdade.

1.4. Afasta a possibilidade do sursis da pena em crime doloso

Outra medida para diminuir o cárcere adotada no Brasil foi a adesão da suspensão da execução da pena. Isto é, caso tenham-se preenchidos os requisitos legais e se submetendo a condições, o agente terá sua execução da pena suspensa por certo período de tempo. Todavia, por expressa determinação do artigo 77, inciso I do Código Penal, caso seja reincidente em crime doloso, esse benefício não poderá ser concedido ao condenado.

Por outro lado, vale ressaltar que o legislador abriu uma exceção quando no § 1º do referido artigo disse que a condenação anterior à pena de multa não impede a concessão do benefício.

1.5. Não permite a substituição da pena privativa de liberdade por multa

Quando a pena privativa de liberdade não é superior a seis meses, pode o Juiz substituí-la por multa (artigo 60, § 2º do Código Penal). No entanto, para isso, precisa atender os requisitos do artigo 44, inciso II e III, e entre eles está o de não ser reincidente em crime doloso. (

1.6. Eleva o prazo para concessão da liberdade condicional em crime doloso

O Código Penal em seu artigo 83, inciso II, que caso o agente seja reincidente em crime doloso, terá o prazo aumentado de um terço até a metade de cumprimento da pena para a concessão da liberdade condicional.

Lembra-se que o livramento condicional consiste numa antecipação à liberdade do condenado que cumpre pena privativa de liberdade desde que realizadas determinadas condições durante um lapso temporal.

1.7. Impossibilita a concessão da liberdade condicional para os reincidentes específicos em crime hediondo ou equiparados.

Caso o agente seja reincidente específico nos crimes hediondos ou equiparados, isto é, crimes de tráfico, terrorismo e tortura (Constituição Federal artigo inciso XLIII), ele não terá direito a liberdade condicional, por disposição do artigo 83, inciso V do Código Penal.

1.8. Determina o cumprimento inicial da pena em regime fechado

O Código Penal, a partir do artigo 33, traz as regras para determinar o regime do cumprimento da pena; nos casos de reincidentes a pena de reclusão será necessariamente o fechado. Essa regra está expressa no artigo 33, § 2º, alíneas b e c do Código Penal.

1.9. Na pena de detenção obriga o regime inicial semiaberto

Por força do artigo 33, § 2, alíneas b e c do Código Penal, o agente reincidente condenado por crime com pena de detenção terá por seu regime inicial de cumprimento de pena obrigatoriamente o semiaberto. Isso porque a detenção não admite cumprimento inicial no regime fechado, todavia, permite a regressão para esse último durante a execução da pena nos casos previstos em lei.

1.10 Revogação obrigatória do sursis se condenado por crime doloso ou revogação facultativa se condenado por crime culposo ou contravenção

Se após a concessão do benefício do sursis sobrevier uma condenação por crime doloso o Juiz deverá obrigatoriamente revogar o benefício de acordo com o artigo 81, inciso I do Código Penal. Por outro lado, se a condenação for por crime culposo ou contravenção, a revogação do sursis será facultativa, como reza o artigo 81, § 1 do Código Penal.

1.11. Revogação obrigatória ou facultativa do livramento condicional

O artigo 86, inciso I do Código Penal, diz que caso durante o período de livramento condicional venha o agente a ser condenado com trânsito em julgado por crime durante o prazo do benefício, isso será causa de revogação obrigatória do mesmo.

Já o artigo 86, inciso II, do mesmo diploma legal, diz que mesmo por crime cometido anteriormente ao benefício e a condenação sendo proferida durante o benefício, estar-se-á diante de uma causa de revogação obrigatória do livramento condicional – desde que a unificação das penas impossibilite esse livramento condicional.

Por outro lado, tem-se causa de revogação facultativa se sobrevier condenação por crime ou contravenção em que seja cominada pena diversa da privativa de liberdade. Isso está positivado no artigo 87, parte final do Código Penal.

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2 Comentários

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Excelentes esclarecimentos, obrigado. Fica com Deus. continuar lendo

Meu marido pegou 39 anos dois crimes colocaram reincidência mais agora eles viram que ele não era reincidente agora foi afastado a reincidência ele ja cunpril 10 anos agora quantos anos ele ainda ficara no fechado por favor mim ajuda continuar lendo